Friday, January 25, 2008

ventanias soltas

não temas as ventanias soltas,
sempre é eternamente o dia
e a imortalidade o momento
o estado das coisas

o futuro é apenas o presente
e este é o minuto em que a tua vida se completa

é este o dia, aquele que persiste
é ele a medida real dos teus sonhos

magia oculta por desvendar

pedro aranda

agora que os anos passaram

agora que os anos passaram
nada restou da vida sonhada
senão a tua vida,
a rosa murchou no teu olhar
e a flor do jardim é de gelo e de cinza

sonhos não são senão sonhos
e o meu foi esperar-te nos idos de abril
num tempo que fui esquecendo

tantos anos esperei por ti
que no escuro da noite ceguei o meu olhar
de desolada tristeza

houve amor apenas no azul perdido dos meus olhos
nos teus, ausência

tatuados em carne viva
só o tempo silenciou os teus passos


pedro aranda

Wednesday, January 23, 2008

os versos que escreveste

os versos que escreveste, minha mãe, apodrecem
na terra que sepulta os nossos antepassados,
o teu canto secou e já não moram aqui
as flores que plantaste no jardim


pedro aranda

Tuesday, January 22, 2008

esquecidos os cantos

esquecidos os cantos da juventude
perdida a candeia que iluminava o caminho
percorro as décadas da idade


os que eram vivos estão mortos
e eu já fui alto e belo como tu

desejava aqui o meu pai
ele que voou pelos céus
qual pássaro fugitivo,
talvez volte amanhã e já não me encontre

ficaram nas terras barrentas dos campos os meus sonhos
nas espigas de trigo balouçando ao vento a minha alma


pedro aranda

Sunday, January 20, 2008

o marinheiro

o marinheiro cavalgou oceanos sem fim,
num dia sem data um pássaro moribundo atravessou o seu olhar,
nesse olhar vislumbrou o incessante tempo


pedro aranda

recorda o que há muito esqueceste

recorda o que há muito esqueceste
o fio doirado por entre o novelo dos anos passados
um chilreio levado pelo vento
um sonho indefinido como a neblina da madrugada
os acordes da música tocada no berço

a criança que conhecia os segredos do tempo


pedro aranda

na memória do tempo

na memória do tempo recordo o secreto beijo
os cavalos com as crinas ao vento
o filho que nunca tive
as aves que não levantaram voo
a erva fresca no leito do rio

onde estão os olhos da mulher que amei
a doce fragância do seu canto
as antigas manhãs onde me perdi
no seu incendiado corpo

com saudade recordo
a mansa brisa das tardes em flor
nos campos da minha infância,
a breve alegria dos suaves momentos,
tempo que na minha memória foi vento

e pergunto aos Deuses
quem acendeu a fugaz luz que foi esta vida?


pedro aranda

nos campos da minha memória

nos campos da minha memória
em terra húmida
escrevo o meu nome

onde deixarei a vida haverá flores
velhos cegos cantando o meu destino
e camponeses sem idade
colhendo os frutos murchos de uma vida por viver


pedro aranda

escuto

escuto
inspirando e expirando escuto.
a vida acontece porque estou escutando,
escuto porque a palavra é muda
e nada há para escutar.

respiro e enquanto respiro vivo.


pedro aranda

sobre o destino

sobre o destino

está escrito que morrerei na primavera,
de madrugada ao raiar do dia

abandonado pelas gentes

pedro aranda

no alto do monte

no alto do monte onde nasci
vigiando os meus passos
esperando o meu regresso
chorando a minha efemeridade

vejo o azul dos teus olhos, meu pai

pedro aranda

aos desertos

aos desertos lego os meus sonhos
à chuva os meus amores
aos ventos os meus versos
e aos meus descendentes o esquecimento
o transitório e o inútil


pedro aranda

sou verso e reverso

sou verso e reverso

sei de muitas coisas que nunca vi
peixes voadores que não existem
mas desconheço o que os meus olhos vêem,
a vida é uma pergunta e não sei a resposta.

em parte incerta habitam os meus sonhos
e amo, amo esta tília.


pedro aranda

canto a alta montanha

canto a alta montanha
serena e misteriosa que se ignora
e a frágil magnólia
na luz que projecta na eterna alma.

na delicada flor que é todas as flores
mora o meu olhar,
doce aroma inacessível à dura pedra que se desconhece.

canto a rude pedra que se cumpre
e não se lamenta do perpétuo desgaste.
canto o castanheiro que ignora o dia e a noite
não dorme
e aceita na infernal tarde o fogo que o consome.


pedro aranda

são vãs as nuvens

são vãs as nuvens no céu
como os pássaros que chilreiam na madrugada
e os homens que os escutam
é vã a vida e a montanha de rude pedra

que o tempo alisará

pedro aranda

onde é a vossa morada

onde é a vossa morada?
pássaros que deixaram de voar, cavalos
de natureza bravia que alcançaram a imobilidade, meu pai
condenado ao alheamento sem fim
eternamente debruçado sobre os campos secos

onde floresce a rosa do esquecimento


pedro aranda